quinta-feira, maio 19, 2005

Do direito a ter opinião

Os blogs vieram despertar algumas consciências para o direito à opinião dos cidadãos. Tal como no crescimento das crianças, há várias fases de cidadania. Neste momento, a Murtosa bloguística estará numa fase de descoberta de si mesma, com tudo o que isso significa de descoberta, de abuso, de confusão, de irritabilidade. Seguir-se-lhe-á outra fase: a fase da afirmação de si mesmo. Nessa altura iremos perceber quem tem motivação para continuar a emitir a sua opinião e a defendê-la de forma construtiva e positiva.
Estamos num tempo de clarificação de motivos e amadurecimento de ideias e de posturas perante uma sociedade que vai abrindo à novidade.
É sempre positivo ler a opinião de outros e haver espaço para o debate de ideias e de posições perante diversas temáticas. Mais que exercícios narcisistas, os blogs podem ser espaços de tertúlia diversificada, de acordo com os gostos de cada autor.
O factor “anonimato” pode ajudar ao crescimento de quem prefere manter-se atrás das cortinas, sem que isso possa ser sempre condenável, desde que em doses e tempos mínimos. O eterno esconder-se não será desejável para o exercício de uma cidadania responsável e interventiva.
O facto é que nunca teremos a unanimidade à nossa volta. Isso é muito bom. A sociedade deve saber dividir as águas, criticar o criticável e aplaudir o positivo que possa existir em pessoas com quem até nem simpatizemos muito. Reparem que há muitos blogs que não permitem espaço de diálogo e há outros que são acerrimamente censurados pelos seus administradores.
Tudo isto é salutar. Ter opinião, ter sentido crítico, saber estar em sociedade, saber viver na Murtosa e saber renovar esta terra.
Se os blogs ajudarem esses objectivos, venham mais cinco!

quinta-feira, maio 12, 2005

Sem comentários

Este texto foi retirado do site do Expresso
e é da autoria do Professor Nuno Crato, figura respeitável do ensino e divulgação da ciência portuguesa.

Não, não é uma cena de filme de terror. É difícil de acreditar, mas foi o que acabou de se passar numa acção de formação de professores que terminou ontem em Lisboa, na Casa Pia.

Duas senhoras fizeram uma análise astral dos presentes e chegaram à conclusão que havia uma falta de «elementos terrenos». Então, para compensar essa evidente deficiência e criar «energias positivas» na sala, pediram aos professores que se descalçassem, de forma a ficarem em contacto mais directo com o solo. No escuro, aumentando o efeito de comunhão com «a Terra», os formandos, de olhos fechados, foram incitados a gritar, com os braços erguidos, para criar energias positivas que se propagassem pelo grupo.

As monitoras explicaram, imperturbáveis, que essa técnica podia ser aplicada nas aulas e ser benéfica para os alunos. Explicaram outras coisas, também. Uma senhora «graduada em astropsicologia», em simbiose com uma outra, que se apresentava como «terapeuta holística e energética», deram várias «dicas» para melhorar o ambiente da sala de aula. Explicaram que, nos exames, seria bom que os alunos vissem objectos de cores azuis e vermelhas. E discutiram as cores que são mais benéficas às diversas aprendizagens. Azul e amarelo para língua materna, como toda a gente sabe, e verde para as ciências. Pois claro...

Explicaram também como se podia fazer a «leitura e limpeza da aura» e mostraram gestos que se podiam praticar nas costas dos alunos, sem lhes tocar e sem eles repararem, mas que teriam um impacto extraordinário na sua «aura». Como isso é importante para o sucesso no ensino! Que estranho que não seja mais usado...

Custa a crer, mas tudo isto se passou num seminário que se intitulava «Dicas para ser melhor professor(a)» e que foi promovido pela Pró-Ordem dos Professores. É um dos «seminários alternativos que têm todo o cabimento», como o defendeu o presidente da dita Pró-Ordem, que disse estar assim a contribuir «indubitavelmente para a melhoria do desempenho da profissão docente».

Tudo isto é inacreditável, mas sente-se o leitor para o que segue. É que, para assistirem, os professores foram dispensados de serviço, sem penalização no salário. Mas os alunos ficaram sem aulas. Tudo ao abrigo da lei. Pergunta-se porque há insucesso escolar. Não seria de começar pelo insucesso no sistema de formação de professores?

terça-feira, maio 03, 2005

Não mata, mas cansa...

“- Por favor venha à minha sala que está lá um menino que não quer sair e que já me ameaçou e tudo.”
Foi assim que fui convocado a deslocar-me a uma sala onde um ganapo de 11 anos fazia frente a uma professora licenciada, profissionalizada e com idade para ser mãe do miúdo.
Que mal fiz eu a Deus ou ao mundo para ter que aturar disto?
Quem forma os professores e os profissionaliza de modo a não terem uma única gota de autoridade?
Quem se apelida de “professor” e logo de seguida teme utilizar a autoridade? Estranho mundo o nosso.
Circula nos sindicatos e por entre professores a teoria de que a legislação portuguesa não permite o exercício da autoridade pelos professores.
Honestamente, alguém que me explique o que se espera da legislação para que um docente tenha ou não tenha autoridade dentro da sua sala de aula.
Será que um pedaço de papel irá obviar à falta de autoridade da minha colega perante o tal garoto de 11 anos?
Será que eu tenho um papel a mais que ela? O facto é que mal me viu, o puto meteu o rabo entre as pernas e foi o mais ordeiro do dia… Mas eu não tenho nenhuma lei diferente daquela que rege a profissão da senhora que me mandou chamar à sua sala.
Não percebo.
Circula na imprensa o facto de que o ministério da educação não consegue controlar as faltas dos seus docentes.
O primeiro ministro veio, urbi e orbi, proclamar que no próximo ano lectivo acabar-se-ão os “furos” dos alunos.
Alguém que me explique como.
Alguém que me explique como é que há professores que passam a vida em congressos, encontros, reuniões de editoras, doenças estranhas, faltas por conta de férias, acções de formação em horário lectivo, reuniões sindicais, ausências inesperadas. E nenhum desses docentes acha isso anormal. Como é que há docentes que afirmam não poder estar numa reunião de conselho de turma porque têm que ir ao médico com alguém da família, ou que já tinham planeado outra coisa para essa data, ou prevêem estar “de atestado médico” nessa altura…?
Não são os “PROFESSORES” que têm este comportamento, são os que distorcem a profissão e que a assumem como uma fonte de rendimento a somar a outras fontes paralelas.
Senhor Primeiro Ministro em estado de graça e com maioria absoluta no parlamento: crie legislação que outorgue aos Órgãos de Gestão da escolas poderes para despedir professores que não são professores, que permita contratar professores que queiram e saibam ser professores e que saibam exercer a “auctoritas” de forma responsável e que saibam ensinar e formar, permitindo a estabilidade das escolas e a melhoria da qualidade do ensino. De outra forma, o ensino continuará a arrastar-se de desculpa em desculpa e os bons professores deixarão de ter incentivo para continuar a melhorar.